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sábado, 24 de março de 2012

Teachers on the Rock: o bom e sempre jovem rock and roll

Em uma divertida entrevista (no "Jô Soares"), o psicólogo e consultor de empresas (e também graduado em teatro) Waldez Ludwig dá uma dica para jovens “perdidos” que não sabem qual profissão “abraçar”. Ele diz que o grande erro da maioria é “só aceitar fazer o que se gosta” (pois com isso, muitos ficam por anos esperando “aquele emprego, aquela sorte, aquela chance”, que pode não surgir, até porque o sujeito não teve oportunidade de mostrar suas habilidades, mesmo que em outra atividade que não a sua paixão).

A dica é, segundo o psicólogo, “gostar do que se faz”, não importando se é, ou não, o que realmente se gostaria de fazer. Quem aprende a gostar do que faz, tem futuro pela frente, e pode-se assim também investir em outra profissão paralela (que, aí sim, pode ser aquela dos nossos sonhos, exatamente a que se gosta).


Nasci numa família de cinco irmãos, “éramos seis” (plagiando o famoso romance da escritora paulista Maria José Dupré), nenhuma novidade na época, pois eram muito comuns famílias numerosas, nos revolucionários anos 60/70. E, por conta disso, diferente das famílias dos dias de hoje (em que o filho único, ou o casal de filhos, vai para a escola, depois para o inglês, a seguir tem o balé, o judô, a aula de música e de computação), tínhamos no máximo direito a uma única escolha, além da escola básica (isso quando a família tinha algum recurso e as finanças permitiam), era ou...ou... e só (ou música, ou inglês, ou balé).

E foi assim que, ainda menina, fiz opção por um curso de música (em detrimento do aprendizado de inglês que, na época, não tinha a necessidade dos dias de hoje – fui bem mais tarde aprender inglês, praticamente sozinha, na marra, de forma totalmente errada, lendo livros de medicina, daí hoje minha boa leitura, já dialogar em inglês continua sendo uma tortura para mim).

E, toda orgulhosa, lá ia eu uniformizada, de gravata, saia plissada e meias três quarto, para o conservatório de música (comecei o curso de piano), e no meio de bemóis e sustenidos, semicolcheias e semifusas, compassos binários e terciários, claves de sol e de fá, solfejos e harmonias, fui percebendo que eu seria uma profissional medíocre se escolhesse a música como primeira opção de trabalho, pois me faltava o primordial que era o dom, o chamado “ouvido musical” (mas terminei toda a teoria musical, naquela época não se podia desperdiçar nada, nem tempo e muito menos dinheiro).

E assim, já com 17 anos, decidi partir para a medicina, pois gostava também de biologia, quem sabe ali eu acharia “minha praia”? E nunca me arrependi, adoro o que faço, me sinto realizada sendo útil ao próximo, e a cardiologia coloca-nos no limite entre a vida e a morte, ensinando-nos o verdadeiro valor da vida. E no vestibular, tirei nota máxima na redação, não foi novidade, pois já vislumbrava em mim o dom da escrita (que deixei adormecido por muito tempo, praticamente só ressuscitando-o agora com o blog, que nasceu por acaso, a pedido de amigos "perdidos" nas locadoras, em busca de dicas de bons filmes).

E então a música, junto com a minha paixão adolescente pelo cinema, virou lazer (só para ouvir, nunca mais toquei a mão num piano ou qualquer outro instrumento). Consigo ainda ler algumas partituras graças ao aprendizado na infância, resquício de memória de criança que segue com a gente para o resto da vida (o que não aconteceu com o inglês, pois só fui fazer um curso de línguas, já adulta). Assim, sempre me delicio ouvindo alguém tocar bem um instrumento (meu filhote é um deles, ótimo na guitarra), e no meu blog de cinema a música é sempre o “coadjuvante” mais importante.

E o blues foi o gênero que me fascinou desde os tempos de menina. Ainda adolescente, ao ler a história dos escravos negros africanos na América que “cantavam, em lamento, a dor sentida na carne e na alma”, me apaixonei pelo ritmo, e nunca mais deixei de ouvir o bom e velho blues, ritmo que tinha sido o precursor do bom e velho (leia-se “sempre jovem”) rock and roll.

E também foi assim que, amante da música, ou melhor, da boa música (que não me venham com pseudo músicas de "cachorra" como o funk, ou as esdrúxulas músicas sertanejas "de corno"), fui apresentada ao grupo “Teachers on the Rock”. Na verdade, sem querer, num papo informal, eu descobri que trabalhava com um dos integrantes do grupo, o fisioterapeuta intensivista da UFF, professor Renato Lacerda (guitarrista nas poucas horas vagas, como bem prega o psicólogo Waldez Ludwig).

O Renato me apresentou os demais integrantes da banda e todos têm uma profissão paralela que curtem tanto quanto a de músico. O professor (de literatura) Carlito é o "mestre" do teclado, o professor (de informática) Daniel "arrasa" no contrabaixo, o Léo (vulgo Bambam) é baterista, o professor (de química) Sérgio é guitarrista e faz vocal com o professor de biologia Fabinho (também guitarrista), este último uma atração a parte, com sua voz potente e uma ótima performance corporal improvisa imitações inusitadas (mescladas com um estilo próprio) de Raul Seixas, Joe Cocker, Celso Blues Boy e, divinamente, do Elvis Presley.

Combinei com o meu amigo guitarrista Renato (o "dublê" de fisioterapeuta) de "dar uma de cinegrafista e filmar decentemente" o grupo em ação, pois os poucos vídeos que encontrei no youtube não é nem um pouco promocional, não consegue transmitir nem de perto a magia real do grupo. No vídeo abaixo, a gravação está muito aquém do que o grupo faz ao vivo no palco, mal se vê os integrantes da banda, e no final do texto, uma gravação antiga, quando a “tchurma” tinha mais “folículos pilosos” e os mesmos ainda não estavam "mesclados de brancos").

E a banda vem galgando seu “lugar ao sol” (como uma segunda profissão, mais um hobby no momento, pelo que pude perceber) e foi assim que, num dos shows do grupo, fui parar (venho “seguindo” o grupo, quando sobra tempo, na minha agenda apertada de emergencista em ecocardiografia) num bar alternativo (na verdade uma velha casa de família, improvisada em bar, que fez lembrar-me da música “Nos bailes da vida” do Milton Nascimento: “para cantar, nada era longe, tudo tão bom, até a estrada de terra na boléia de caminhão... todo artista tem de ir onde o povo está”).

O lugar tinha um ambiente divertido, com paredes “detonadas” (não propositadamente, a casa é velha mesmo, carente de reformas), no melhor do "estilo grunge”. Se soubesse que o ambiente era tão grunge, “camaleoa” que sou, teria ido de botas, camisa xadrez e com um belo jeans rasgado, mas o meu amigo Renato não soube definir o ambiente ao me convidar (homens não entendem nada de decoração e moda estilosa, a não ser os dois maiores divulgadores do estilo grunge, nos anos 90, o falecido Kurt Cobain do extinto "Nirvana" e o Eddie Vedder do "Pearl Jam").

Em uma decoração improvisada com recadinhos dos frequentadores em papéis espalhados por todo canto, guitarras e camisas com estampas de bandas de rock penduradas em cabides no teto, cartazes de cinema nas paredes (que já me conquistou de cara), frases e trechos de músicas de artistas famosos, escritos diretamente nas paredes, era um  ambiente familiar e, embora muito simples, era extremamente agradável, ainda mais por conta da galera de jovens estudantes que sempre seguem seus “teachers” trintões (alguns quarentões e até cinqüentões) aonde quer que eles toquem. Assim, a platéia freqüentadora da banda é bastante eclética, de “pirralhos” aos “eternos jovens órfãos” nascidos nos revolucionários anos 60/70, saudosos dos ritmos que mudaram toda a trajetória da música contemporânea.

E como não podia deixar de pensar (e falar) em cinema, o ótimo filme “Quase famosos” (veja, na "lista de filmes", aqui no blog) mostra o saudosismo dos anos revolucionários, quando as bandas de rock percorriam esse mesmo caminho árduo para alcançarem um “lugar ao sol”.

O psicólogo Waldez Ludwig dá a dica para que estimulemos nossos jovens filhos a não se limitarem numa só atividade profissional, a procurarem sempre investir no maior “leque” de opções que for possível. Mas é vital tentar ir até o fim nos investimentos profissionais em curso, para então poder escolher o caminho que for mais certo em termos econômicos, e assim os demais talentos poderão ser investidos no decorrer da vida já financeiramente estabilizada, como os mestres do grupo "Teachers on the Rock".

E assim, termino esse texto, deixando para as novas gerações um pouco dos revolucionários anos 60/70 com o filme "Almost famous"(link* para o texto sobre o filme, no final do texto), e a dica infalível de se dedicar a tudo que se goste, e não se fixar num só ponto. Somos versáteis e podemos oferecer ao mundo muito mais do que imaginamos. É a dica para os jovens que, perdidos, não sabem ainda o que fazer da vida – que profissão escolher, que caminho seguir, qual o seu dom e o seu tom (meu filho mais velho está cursando medicina na UFF e ao mesmo tempo está aprendendo navegação e paraquedismo, e o mais novo tem um talento nato para instrumentos musicais – a guitarra é a “praia” dele – mas está cursando a faculdade de publicidade na ESPM, e quer tentar também, em paralelo, o difícil caminho da música).

Eu, por exemplo, curto “de montão” a minha profissão principal (médica cardiologista ecocardiografista) e, informalmente como "dublê de escritora e crítica de cinema", por conta da descoberta desse meu aparente talento para escrever, já tive chance de ser contratada para um jornalzinho local da cidade (pois é assim que tudo começa, "na estrada de terra, na boléia do caminhão"), mas no momento assumir um compromisso de escrever “sob encomenda” não está nos meus planos (tenho que terminar minha tese de mestrado), mas quem sabe, num futuro próximo, principalmente se pintar um bom semanário...

E recomendo a página no "facebook" dessa banda de mestres (lá vocês encontrarão tudo sobre o “Teachers on the Rock”, agenda de shows, etc) que encontraram na música outra forma de transmitir seus ensinamentos a essa novíssima geração globalizada. Parabéns para o grupo. Eles merecem.
http://rosemerynunescardoso.blogspot.com.br/2009/12/o-filme-quase-famosos.html




sexta-feira, 16 de março de 2012

Janela de Johari: que imagem as pessoas têm de você?

Um colega de trabalho (sequer trabalhamos no mesmo setor) tenta me convencer que eu tenho que mudar o foco das minhas “brigas” no trabalho. Anarquista que sou, estou sempre às voltas “levantando alguma bandeira” contra alguma injustiça, mau-caratismo e falta de ética. Esse é simplesmente o meu jeito.

E o colega retruca: “tudo bem, lute, levante bandeiras, mas direcione melhor o foco para obter resultados positivos, e para evitar que te sobrecarregue em estresse inútil”. Sim, até concordo, mas já faço isso, apenas o colega só me viu numa das muitas situações que me encontro ao brigar contra injustiças e, equivocado, acha que só dou “murro em ponta de faca”, sempre.

Se fosse assim, eu não teria sido eleita unânime representante da minha turma de mestrado. Ao perguntar, na época, por que me escolheram (já que sou tímida e nem tenho espírito de liderança), a resposta foi: “porque você é brigona, e quando você briga as coisas sempre acontecem, sempre melhoram” (é o reflexo das minhas boas "brigas").

Mas nem sempre é assim. Já perdi muitas “brigas”, e inclusive me prejudiquei, por tentar “bater em ponta de faca”, tudo porque esperei apoio das pessoas à volta (pois só uma andorinha em geral não faz verão), e infelizmente as pessoas costumam se acovardar, se escondem, não querem se comprometer.

Mas eu não consigo me abster, tenho que me envolver, para mim é vital, só assim consigo botar a cabeça no travesseiro e dormir tranqüila, com a sensação de dever cumprido, mesmo que “a luta” não dê em nada (mas infelizmente não é assim com todos, muitos se omitem numa clara alusão de “não é comigo, nem com os meus, então prá que me meter?”).

Ao contrário, quando no passado tentavam me calar, eu não era eu, me sentia anulada. A sensação de desconforto, aí sim, é enorme quando eu não entro numa "luta", me sinto covarde se não lutar contra algo que acredito injusto, me sinto omissa, conivente, e daí sim me vem uma sensação de angústia por não ter feito nada, por não ter reagido, por não ter exposto meu ponto de vista, por não ter me posicionado.

O colega em questão só conheceu um dos meus lados “brigões” (uma das brigas ruins). Mas mesmo assim, me fiz ouvidos e deixei-o falar (retrucando sempre, pois rebelde, não consigo ficar quieta sem expor meus argumentos para minhas atitudes). E foi assim que me lembrei da “Janela de Johari” e que sempre reluto em aumentar meu “feedback”( já consigo reconhecer o meu “eu cego”, mas ainda não consigo lidar com ele).

A janela de Johari é uma ferramenta de auto-conhecimento, usada por psicólogos (inclusive o nome Johari são as iniciais dos dois psicólogos que criaram a tal janela, Joseph Luft e Harrington Ingham, há cerca de 50 anos) que mostra a interação entre a nossa auto percepção e a maneira como os outros nos vêem.

Pode haver uma grande diferença entre a percepção que temos de nós mesmos e a forma como os outros nos avaliam. Por exemplo, podemos nos achar perfeccionistas, mas os que convivem conosco podem estar insatisfeitos com essa nossa suposta qualidade, achando na verdade essa “perfeição” um defeito, por tornar a vida delas um transtorno, por conta das nossas exigências “perfeccionistas”. Outro exemplo, você pode se considerar uma pessoa sincera, mas os outros à sua volta podem estar enxergando você como uma pessoa crítica, por conta de sua “extrema sinceridade”.

Assim, a janela de Johari é dividida em quatro quadrantes que auxiliam no processo de percepção do indivíduo em relação a si mesmo (veja o vídeo do programa "Saia justa" do canal GNT, antes de prosseguir):
O “eu público” ou “eu aberto” (ou “arena”) – é a parte formada pela própria auto-percepção do indivíduo, igualmente percebida pelos outros à volta (quanto mais transparentes somos, mais confiáveis seremos).

O “eu fechado” (ou “eu secreto” ou “fachada”) – só o indivíduo conhece tais características sobre si mesmo ( muitos mal entendidos poderiam ser desfeitos se nos abríssemos mais com as pessoas com as quais convivemos)

O “eu cego” (ou “mancha cega”) – é a área mais complexa, pois desconhecemos (ou não queremos admitir) o que os outros percebem em nós. É a mais difícil pois depende do feedback das pessoas que deveriam expor nossas falhas e defeitos, mas nem sempre as pessoas querem se indispor com o próximo apontando seus defeitos (e o contrário também é verdadeiro, nem sempre estamos dispostos a ouvir e corrigir nossas falhas).

O “eu desconhecido” – compreende a área do nosso inconsciente, ou seja, nem nós nem os que nos cercam conhecemos esse nosso lado. Só vamos conhecê-lo quando formos colocados diante de situações extremas em que pensávamos que agiríamos de uma forma e ao contrário podemos reagir de outra (por exemplo, só saberemos como realmente reagiremos a um assalto quando estivermos diante do mesmo).

A escritora e filósofa Márcia Tiburi, em seu vídeo  intitulado “Branca de neve”, mostra os nossos sete pecados, nossas “personas” escondidas no nosso íntimo, e como elas se misturam para formar nossa personalidade, que dependendo das nossas relações inter-pessoais, recentes ou antigas (no trabalho, no amor, na amizade, na família), vamos mostrando umas mais que as outras, escondendo umas, revelando outras.
A par da “janela de Johari” e dos nossos “eus” e das nossas muitas “personas” volto ao tema das minhas “brigas”. O tal colega (que me dá o feedback) na verdade desconhece o que há por trás das minhas brigas. Ele está tendo (como é muito comum) apenas uma visão parcial incompleta do meu "eu". É certo que minhas atitudes do presente são conseqüência de uma omissão (praticamente involuntária) no passado. Fui lesada moralmente, num passado distante, numa situação limite que me prejudicou profundamente (mas na época eu não tinha percepção disso), e temerosa escondi o fato de todos, e tentei apagar, em vão, da minha memória.

Foi quando, anos mais tarde, soube de outros que a seguir também foram lesados, e não me perdôo por ter sido omissa, pois se eu não tivesse ficado calada, se tivesse colocado “a boca no trombone”, outros não teriam sofrido o mesmo que eu. Isso faz parte do meu “eu secreto” da janela de Johari, mas os poucos que tomaram conhecimento em detalhe, bem sabem que eu não tive alternativa na época, mas mesmo assim eu não me perdôo, minha omissão foi prejudicial para muitos, e para compensar o meu silêncio, hoje reajo com indignação e denuncio toda e qualquer forma de injustiça, mau-caratismo e falta de ética.

O problema é que eu sou impulsiva e tento me controlar, mas nem sempre eu consigo – estou na terapia para tentar atingir um meio-termo (pois jamais deixarei de ser “adorável anarquista”, gosto de ser "brigona", me faz bem ) – assim, enquanto não tenho auto-controle, minhas brigas ora são boas ora ruins.

A última boa “briga” que me envolvi foi finalizada com uma carta que escrevi direcionada ao meu chefe superior (que há chance de dar bons frutos, segundo os elogios que recebi relacionados a esse meu manuscrito), cujo objetivo é beneficiar todo um grupo (mas escrevi e sozinha assinei embaixo, já que no passado pedi um abaixo-assinado do tal grupo que nunca aconteceu).

Já estou acostumada a esse desapego das pessoas por causas que, aparentemente, não lhes dizem respeito (mas interessante, se gerar frutos positivos, ninguém há de reclamar, se não, a única prejudicada prá variar serei eu, mas que fazer? não vou deixar de "anarquizar" só porque uns e outros se omitem). Sei que a ação de alguns é crucial para a melhoria de muitos (e eu prefiro fazer parte da minoria que age, ao invés de esperar cair do céu), mas se houvesse um maior comprometimento desses muitos, a melhoria seria muito mais real, rápida e certa. Mas...

Um exemplo recente, dessa falta de compromisso das pessoas com o próximo, presenciei há pouco tempo. Estava eu de volta do meu passeio de cruzeiro, desembarcando no porto do Rio de Janeiro, em pleno sábado de carnaval e, prá variar, a cidade maravilhosa tinha dado um “nó cego” no trânsito, por conta do feriadão (maldita hora que não pensei nisso), e a informação era que a ponte Rio-Niterói estava quilometricamente engarrafada, assim desisti do meu taxista que viria de Niterói me buscar (na verdade, um paciente que virou amigo e me carrega para portos e aeroportos) e decidi pegar um “táxi comum”, numa fila na saída do porto, para ir para as barcas.

Eis que, já na fila (que não parava de crescer), debaixo de um sol “castigante”, os táxis chegavam e, para surpresa de todos, de repente, aparecia alguém (que nem estava na fila e tranquilamente saía de alguma sombra) e dizia ter “chamado o tal táxi pelo celular” e assim embarcava e partia, sem nenhum pudor.

Por conta desse abuso que seguia recorrente, o burburinho na fila foi tornando-se irritante (já detesto ficar em fila, ainda mais com um calor insuportável e pessoas reclamando uns com os outros), mas ninguém tomava uma atitude. Eis que o próximo da vez era um casal de italianos, e toda a vez que eles se dirigiam para o táxi que chegava ao ponto, alguém aparecia e tomava a vez deles, e sem entender nada o casal dirigia o olhar para todos nós da fila, indagando em italiano e “portunhol” o porquê daquilo estar acontecendo, e ninguém nada fazia e nada dizia ao casal.

Assim, não perdi mais tempo, saí da fila e fui ao encontro do casal. Eram dois idosos, e eu, também no meu portunhol e no meu italiano sofrível, composto de pouquíssimas palavras (o cinema italiano é o meu único “professor”), pedia desculpas (“mi spiace”) pelo comportamento deplorável do nosso povinho brasileiro,

e passei a interpelar cada um dos que burlavam (tanto o taxista quanto os passageiros fura-filas) a vez do casal de estrangeiros, explicando, calmamente, mas de forma enérgica e concisa, que “ali era uma fila de ponto de táxi, portanto quem tivesse chamado um táxi por celular deveria embarcar fora dali, nos arredores da rua”(é o que meu taxista sempre faz quando vai me buscar), pois atravancavam o ponto (com malas e mais malas), impedindo que os táxis “normais” tivessem acesso ao local  –  alguns foram até cordiais pedindo desculpas, alegando não terem pensado estar “furando fila”, outros foram grosseiros e praticamente trataram (a mim e ao casal de italianos) com desprezo, dizendo rispidamente “vou pensar nisso, mas agora me dá licença, porque estou com pressa e você está me atrasando” e eu dei meu recado também rispidamente “então pense, pois no futuro quem sabe a bola da vez pode ser os seus próprios pais”.

Tive adesão de alguns transeuntes da fila, mas a maioria ficou impassível, apesar de reclamantes. Um dos amigos que estava comigo, me diz: “Rose, muitos não têm idéia de estarem cometendo uma injustiça”, ao que eu retruco: “mais um motivo para não ficarmos calados, pois só assim esses muitos terão que começar a pensar sobre suas atitudes”.

Sei que não é fácil essa minha abordagem (por isso muitos se abstêm), pois às vezes não fica só na rispidez das palavras, alguns partem para a ignorância e insultos, e eu, sangue quente que sou, não corro da briga, e para mandar também um “fuck you” como resposta malcriada não me custa muito (por isso o colega falou para eu “maneirar” nas minhas brigas, pois ele provavelmente se referia a uma dessas minhas brigas no trabalho que descambaram para esse lado  – em defesa da ética médica contra um professor mau-caráter).

Mas que fazer? Paciência. Sou “adorável anarquista”, mas não tenho sangue de barata. Não consigo não me envolver, me comprometo e ainda assino embaixo, literalmente. Não tenho medo de me expor. Alguém já disse que “mulheres comportadas não fazem história” (acredito nisso, não no sentido do “bom ou mau” comportamento sexual, e sim no sentido de submissão) e eu sou dessas nada comportadas, nada submissas, eu não aceito nada que me queiram enfiar “goela abaixo”, sem antes retrucar. Muitos insistem em me dizer: “Cuidado com o que você fala e/ou escreve, podem usar contra você”.

É a patrulha dos “politicamente corretos” (leia-se “pensam como você, mas não falam como você, por puro medo”). O que me faz lembrar de uma vez em que, num papo informal num barzinho, eu falei:  “é o samba do crioulo doido”. Ao que um amigo gaiato, no melhor da “patrulha dos politicamente corretos” , corrigiu: “ é o samba do afro-descendente com surto psicótico”. Hilário. Stanislaw Ponte Preta (Sérgio Porto) se estivesse vivo seria tachado de politicamente incorreto e teria que mudar o nome da música dele (veja vídeo no final do texto).

Agradeço a preocupação dos colegas e amigos, mas ainda não me convenceram que estou no caminho errado (meu “eu cego” entra em conflito com o meu “eu secreto”), e acho que aqui vale o velho ditado “quem não deve, não teme”. E infelizmente, estou mais para o “estilo Malcom X do que para Martin Luther King” (mas nenhum dos dois, cada um a seu modo, deixou de denunciar as injustiças sociais, mesmo sob a pena de serem assassinados, o que acabou por acontecer). E vale lembrar (aos omissos) das palavras de Martin Luther king:  “o que incomoda não são os gritos dos maus, mas sim o silêncio dos bons” .

Gostaria de ser mais pacifista nas minhas colocações, mas confesso ainda não conseguir isso, sou impulsiva e autoritária, e meu “eu cego” (não tão cego assim, pois já tenho plena consciência desta minha deficiência) não me deixa ser moderada nas minhas palavras e atitudes (o difícil é corrigir isso, mas estou empenhada nisso, com a ajuda da minha terapeuta). O ideal é não ficarmos cegos e nos abster dos julgamentos (via feedback, que tanto pode ser positivo como negativo) com falsas presunções, mas também não nos deixar abater pelo que nos dizem.  

Mas consigo ser moderada quando escrevo, talvez porque por ser tímida, eu não consiga expor com clareza meus pensamentos durante um diálogo, e assim se sou mal interpretada, tenho tendência (devido a minha impulsividade) a interpelar meu ouvinte, e o que muitas vezes deveria ser um papo cordial, acaba se tornando um embate muitas vezes improdutivo, e como também tenho o defeito de ser orgulhosa, às vezes me deixo levar por esse sentimento, e a coisa pode descambar para uma ruptura entre os dois lados, infelizmente.

Mas eu me dobro, não sou de todo orgulhosa, pois se me convencerem que estou errada, eu juro que me dobro – mas o difícil é me convencerem, pois em geral, o que acontece é o contrário, já que procuro ter conhecimento de causa nas discussões que, por acaso, eu me envolva, e meus argumentos são em geral convincentes, embasados em estudos e estatísticas, e assim acabo dobrando meu “oponente” (é bem verdade que, às vezes, o meu oponente também é autoritário como eu, e não satisfeito em perder na “queda de braço”, sai da discussão, sem aceitar a “derrota”, e a ruptura ocorre então contra a minha vontade).

No fim, o que posso concluir é que o ideal é que devemos evitar julgar as atitudes dos outros (e a nossa também), e sim nos manter atentos para os resultados que colhemos dessas nossas tais atitudes (e a dos outros), ou seja, se geram resultados positivos ou negativos, quaisquer que sejam estas atitudes. E pensando assim, colocando numa balança, minhas atitudes têm gerado mais pontos positivos que negativos para o meu psique e para as minhas relações interpessoais (às vezes demoram para reconhecer que a minha "briga" era construtiva).

A verdade é que não é nada fácil lidar com o nosso psique (e com o dos outros é ainda mais complexo), e somos todos falíveis (ou então atire a pedra quem acha que não tem teto de vidro).  Um terapeuta por trás para nos auxiliar a, pelo menos, enxergar nossas falhas (resolvê-las já é outra batalha) pode ser o diferencial. Mas na minha opinião, antes de agradar aos outros, eu tenho que estar bem comigo mesma, e sem "brigar" decerto eu fico mal com o meu íntimo. Preciso só aprender a "maneirar" um pouco. Mas se for preciso, nada como o bom e velho "fuck you".  Portanto, saudações "anarquistas".

E para ilustrar, deixo a homenagem do U2 ao Martin Luther King com as músicas "MLK" e "Pride" ("In the name of love") e, claro, não poderia deixar de citar o cinema – o trailer de "Malcom X" (vivido pelo excelente ator Denzel Washington, dirigido por Spike Lee) e o filme “Persona”, de Ingmar Bergman (leia sobre esse filme e sobre esse grande cineasta sueco, aqui no blog, na lista de filmes) que é o protótipo da crise de personalidade que o ser humano passa em alguma época da sua vida, um questionamento profundo do ser humano e da sua psique. 








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