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quarta-feira, 10 de fevereiro de 2010

Mau gosto não se discute, se lamenta

Já não é a primeira vez que insistem e tentam me convencer a ouvir "música sertaneja", ou melhor, "dupla sertaneja" (aliás, pseudo música sertaneja). Já disseram que era má vontade minha, que eu não me dava a chance de tentar ouvir (e gostar) desse tipo de música.

Juro que eu já tentei, e não foi só uma vez, não é má vontade, até fiz um esforço sobrenatural, mas...... não dá. Falta qualidade nas letras, são versos muito simplórios, e as tais “duplas sertanejas” são muuuuuito chatas, muuuuuito bregas, cantam gritando, com uma voz esganiçada, estridente, extremamente irritante (e olha que me indicaram os melhores, fico a imaginar os piores do ramo).

Há pouco tempo atrás fui convidada por uma amiga prá assistir a um desses shows (vulgarmente chamados de) "sertanejos", num bar noturno. Foi um sofrimento sem fim, ninguém dançava, a não ser umas “garotas” de vestimenta suspeita (apesar do lugar de relativo bom gosto), até que o cantor (se é que se pode chamar o dito cujo de cantor) resolve mudar o enfoque das letras das músicas anunciando, dali prá frente, tchan..... tchan.... tchan....tchan....

Pasmem,....“músicas de corno”. O interessante é que a pista de dança, até então vazia, de repente lotou, todos se animaram com as tais letras recheadas de “chifres”, cantando em uníssono com o tal cantor “ruinzinho”. Que coisa louca ....prá lá de bizarro, antigamente, declarar-se corno, era vexatório, agora é moda ostentar “galho”?

Música “sertaneja”, que nada, prá mim é mais uma massificação cultural, que de sertão não tem nada. Essa cultura de massa foi inventada para pura exploração comercial (não é novidade prá ninguém que, muitos cantores sem sucesso, iniciantes na MPB, eram convencidos pelos seus empresários, para entrarem nesse filão do mercado, pois era "retorno financeiro garantido"), visando um público aculturado, nada exigente, com cantores “chulé” que gritam, ao invés de cantarem, com letrinhas “chinfrim”, que qualquer caminhoneiro escreveria  e cantaria melhor (talvez até com mais sentimento e mais poesia).

Uma coisa é música de roça, interiorana, de raiz, isso sim, é legal. Na roça, “sertãozão” mesmo, não tem guitarra, os instrumentos que acompanham os cantores (em geral com vozes de lamento) são a gaita, o violão e o acordeom. O maior representante dessa música foi o Luís Gonzaga (com o clássico “Asa Branca”) e Gilberto Gil "arrasa" cantando "Paisagem na janela", uma autêntica música sertaneja, no ótimo filme "Eu, tu e eles"- veja vídeos no final do texto.

Assim como dizem que, o jazz e o blues é “a dor sofrida  transformada em dor cantada”, pelos negros escravos americanos catadores de algodão, saudosos de sua terra natal, a legítima música do sertão brasileiro é também sofrida, canta a dor do sertão, da seca, da pobreza infinita, .....  ao contrário, ouvir essas pseudo duplas “sertanejas”  é sofrimento sim, mas para os ouvidos, é pobreza sim, mas de espírito.

Os fervorosos defensores desse "pseudo gênero musical" dirão que o estilo é romântico, e que se não fosse bom, não lotaria os estádios e casas noturnas, discordo totalmente,

em primeiro lugar, esse tipo de música peca pelo excesso de cafonice, convenhamos, prá ser romântico não precisa ser brega, há  músicas excelentes da nossa MPB que são românticas e nada bregas, muito bem representadas por excelentes bandas, como por exemplo, Titãs e Paralamas do sucesso, e interpretações divinas na voz, por exemplo, da Marisa Monte e da Adriana Calcanhoto,

e em segundo lugar lotar um show não quer dizer nada, sempre haverá público lotando estádio em qualquer tipo de show. E lá vêm os defensores dizendo que “faz sucesso até nos EUA”, pode até fazer, mas o público que lota esse tipo de show, tem o Bush como líder, um “letrado” que não sabe se expressar nem na sua própria língua, aculturado, representante da pobreza intelectual daquele país, que mal consegue achar o próprio país no mapa,

e se lá, no 1º mundo, existe isso, imagine aqui com os “novos ricos”(o protótipo deles são os jogadores de futebol), ter dinheiro não significa ter cultura, muitos abastados são analfabetos culturais, daí vemos até a zona sul render-se ao ridículo funk, com suas letras de baixo calão, e sua dança vulgar de cunho sexual, nada sensual ( mulher nenhuma fica sensual numa dança que prima por movimentos simiescos e frenéticos, com celulites tremulando em roupas apertadas de gosto duvidoso – “calça da gang” vestindo as “cachorras” é o “ó do borogodó”),

pois pode apostar, as garotas da zona sul que curtem esse tipo de dança são, na sua grande maioria, pertencentes a classe social dos “novos ricos”, e são aculturadas e de cabeça oca, como qualquer excluído da zona norte, apesar de freqüentarem faculdade paga pelo papai “novo rico”, isso vale também pela preferência por essas músicas bregas sertanejas, de letrinhas chinfrim e cantores de voz esganiçada.

E se é prá lotar, temos os programas de gosto duvidoso que são campeões em audiência, os do tipo Silvio Santos, Faustão, e as baixarias explícitas como Big Brother, além das novelas com temas que giram em torno de  traições e mau-caratismo, todos sem exceção, têm audiência garantida, porque não fazem pensar, é só mediocridade explícita.

Rubens Alves, professor, escritor  e  psicanalista, escreveu sobre o “vício que as pessoas adquiriram de não pensar”, e dá “dicas” de como embotar mais e mais a mente, afirmando  que há "leituras especializadas" em impedir o pensamento, como  os jornais e revistas que publicam sempre os mesmos casos com caras e nomes diferentes ("O Globo" de domingo, revista “Caras”) assim fica garantido que só se pensará sempre as mesmas coisas”, e dá a dica prá “não se esquecer de ver o Silvio Santos e o Gugu Liberato” para mais alienado ainda ficar, pois assim “terás uma vida tranqüila embora banal, mas você não perceberá o quanto banal ela é”, termina o escritor.

Funciona como lavagem cerebral, ou seja, a falta de acesso a outros estilos musicais e a massificação da mídia tornam mais fácil a aceitação pelo público classe C que lota esses shows, pois as letras dessas músicas são precárias, não precisa usar massa cinzenta para entendê-las.

Quer um exemplo? Músicas horrendas de propaganda eleitoral e jingles chatérrimos de propaganda comercial ficam impregnadas no nosso subconsciente pela repetição em demasia, e sem percebermos, e apesar de muitas vezes detestarmos as  tais “musiquinhas”, acabamos por decorá-las e sem querer nos vemos cantarolando tais músicas.

Tal é o poder da mídia – é assim que funciona, lavagem cerebral total – com as músicas das aberturas de novelas então nem se fala, eu, por ex, detesto a música “como uma deusa” (sei lá se esse é o título) da tal cantora prá lá de brega Rosana, mas sei “de cor” quase toda a letra da música, tal a lavagem cerebral da época, de tanto que se ouvia essa musiquinha brega, o mesmo vale pro “Fuscão preto” e tantas outras lavagens cerebrais.

Portanto, não é má vontade, acontece que, depois que se tem acesso a estilos musicais como o blues e os jazzistas americanos, a um bom rock, a talentos como Tom Jobim, Chico Buarque, aos mineiros do Clube de esquina e seus seguidores, fica difícil gostar dessa falsa versão eletrônica camuflada de “música do sertão", pois a diferença na qualidade é gritante.

Isso vale também prá quase todos os  programas televisivos brasileiros – depois de assistir programas de bom padrão, que discutem política, boa música, educação e cultura, e que fazem pensar, como por exemplo, Manhattan Conection e Saia Justa (que infelizmente só passam na TV paga),

fica difícil assistir aos programas de gosto duvidoso (que infelizmente recheiam a TV aberta) como os Big Brothers da vida com seus temas que exaltam a depreciação do ser humano em zombarias e escárnio ao próximo, a exploração do corpo feminino em programinhas chulos com seus chavões repetitivos e de cunho sexual como Zorra total,

e fica igualmente difícil assistir a novelas recheadas de traição, antiética e mau-caratismo, como se fosse esse o universo normal, no dia a dia do brasileiro comum que, de tanto assistir a essas baixarias, passa a aceitar tais “predicados” como se fizesse parte da índole do brasileiro, inclusive dos nossos políticos, dos servidores e dos órgãos públicos, empresários, etc, como se traição, falta de ética e de caráter fizessem parte de uma "herança genética" maldita do povo brasileiro (quem nunca ouviu a máxima "brasileiro já nasce corrupto" e a famosa lei de Gérson "o importante é levar vantagem em tudo"?).

Bem, sei que o tema gera polêmica, mas afinal, anarquista ("graças a Deus”) que sou, só posso finalizar assim - gosto é gosto, não se discute, mas mau gosto, esse sim, se lamenta. 


P.S. Dos grupos atuais, o único, de razoável bom gosto, que realmente representam a música sertaneja, é o grupo "Falamansa" (vide abaixo).
 




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