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domingo, 11 de julho de 2010

A justiça divina e a dos homens. Até quando esperar?

Na minha profissão (sou médica), deparo frequentemente com pessoas que simplesmente “entregaram os pontos”. Enquanto escrevo, me vem à lembrança o olhar de uma delas, uma moça de uns 30 anos, a sua voz ainda soa lúcida (e até serena) na minha mente, num semblante neutro de alguém que desistiu da luta, já não mais espera nada, nem da vida, nem de ninguém.

E o pior, se acomodou, não tem mais reações, nem de tristeza, nem de ódio, simplesmente não espera nada mais da justiça divina, muito menos da justiça dos homens,... e eu do outro lado, mesmo tendo que, eticamente, demovê-la dessa idéia mas, no meu íntimo, uma voz interior, dizia para mim mesma, “sim, ela tem razão, lutar para quê???”. Qual o sentido dessa vida, nesse mundo tão ingrato? As pessoas, para todo lado que se olha, não mais se doam, não pensam mais no próximo, não mais se colocam no lugar do outro.

Conformada, resignada, como alguém que aceita o seu destino, a sua sina, o seu carma, ela me disse que só persistia no tratamento da sua doença, por causa da filha pré-adolescente, mas que assim que a menina  estivesse “mais crescidinha”, ela iria desistir de lutar, e eu argumentei o erro que ela cometeria, pois em pouco tempo entraria em coma”, se abandonasse o tratamento, e ela apenas deu de ombros” como resposta, mostrando o quanto a vida pouco importava para ela.

Voltei para casa, mas os olhos vazios e vagos daquela moça não me abandonavam, e como sempre, durante o meu banho (é quando eu consigo me encontrar comigo mesma”, e reflito sobre o meu dia, e daí a inspiração brota fácil), angustiada pela sensação de impotência diante do drama da moça (a doença dela é grave, perdeu a chance de cura, mas tende a se arrastar por anos e anos até que um dia...), por não ter tido argumentos convincentes, nem mesmo para mim mesma, minha mente e minhas mãos ágeis colocaram no papel essas palavras e essas reflexões, que agora compartilho com quem sabe me queira ler.

E como tudo que vivencio me leva ao mundo do cinema, me lembrei do belo filme “Minha vida sem mim”, e também de “Mar adentro” (link*, no final do texto, sobre este último), em que os personagens, nesses dois filmes, estão convencidos de que a morte (assim como a moça que conheci) é o único caminho a seguir, e só resta a eles aceitar, e dar as mãos ao seu destino.

“Minha vida sem mim” é um filme delicado e sutil, e triste (sim, muito triste mas não é um dramalhão piegas e muito menos previsível). Depois de descobrir que um câncer lhe roubará a vida dentro de alguns meses, uma jovem de vinte e poucos anos (a atriz Sarah Polley protagonizando com Mark Rufallo), toma duas decisões importantes: ocultar a doença de todos e redigir uma lista das coisas que pretende fazer antes de morrer – e seus desejos incluem “fazer amor com outro homem” e “fazer alguém se apaixonar por ela”.

Nos dois filmes, os personagens condenados assumem uma postura um tanto quanto egoísta, não mais se importando com os seus à sua volta, mas... quem somos nós para julgar alguém na posição deles? Por que esperar atitude altruísta de quem tanto esperou de todos e nada recebeu?

O que, para nós, pode até parecer melancólico, triste, e “soar como depressivo”, para eles é apenas a constatação de que não vale a pena viver daquele jeito, que a vida perdeu o sentido (o tal sentido da vida que nem sabemos direito qual é), daí a serenidade e aparente paz de espírito pela difícil escolha (assista, no final do texto, trailer do filme e a bela música Sometime later, que faz parte do filme).

E, para terminar, no meio desse turbilhão de emoções, que sempre foi mais um dia na minha vida profissional, e como, além da minha profissão, minha vida sempre gira também em torno da música, lembrei-me de duas belas músicas que ilustram bem esse texto (“Everybody hurts” do R.E.M. e “You got a friend” de James Taylor)

“Everybody hurts” (R.E.M.)

Well everybody hurts,
sometimes, everybody cries,
And everybody hurts ...sometimes
But everybody hurts sometimes
So hold on, hold on, hold on,
Everybody hurts
You're not alone


“You got a friend” (James Taylor)

People can be so cold.
They'll hurt you and desert you.
Well they'll take your soul if you let them.
Oh yeah, but don't you let them.


 * http://rosemerynunescardoso.blogspot.com.br/2010/06/de-medico-e-louco.html









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