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domingo, 19 de janeiro de 2014

"Menáge a trois" no cinema não pornô

Avessa a “unanimidades” (pois, como dizia Nélson Rodrigues, “a unanimidade é burra”), eu não consigo ficar calada diante de uma polêmica, tenho sempre que revidar, e como “feminista e adorável anarquista” eu vou logo contestando tudo que tentam “me enfiar goela abaixo”, principalmente se percebo um ranço machista em torno de uma polêmica ou de uma notícia “unânime”. E se há uma coisa que me irrita mais que homem machista é conversinha de mulher machista.

Por que o meu desabafo acima???!!! Desde o surgimento da TV a cabo (quando passei a poder escolher programas nacionais de qualidade na TV fechada), eu me recuso a perder meu precioso tempo com a TV aberta, já calejada com a má qualidade e as baixarias explícitas da programação deste veículo de (ausência de) cultura e comunicação. Assim, só fico a mercê da TV aberta quando estou no meu plantão noturno no hospital (isto quando pinta uma folga no agitado turno em que trabalho). Assim, muito de vez em quando, quando ao passar na sala de repouso da minha equipe de plantão, noto a telinha em geral registrando os sofríveis filmes enlatados e dublados, ou então as baixarias dos BBBs da vida, quando não são as fatídicas e “chatérrimas” novelas globais.
E por conta disso, há poucos dias, num bate-papo com o grupo de pessoas que estava na tal sala, comentei a minha impaciência (evitando dizer a palavra ojeriza, para não ser tachada de elitista) em acompanhar novelas que duram longos meses, e que no máximo me limito a assistir minisséries que durem no máximo algumas semanas. 

Assim, perguntei sobre a nova minissérie da Globo, a tão comentada “Amores roubados”, que acabava de estrear (e que já terminou, e eu acabei não assistindo a nenhum capítulo), quando então ouço a declaração, de mais de uma das mulheres do bate-papo, que “a tal série já começou mal”, que “é cheia de baixaria dentro e fora da mesma”, ao comentarem (e concordarem com a mídia) sobre o suposto “triângulo amoroso” envolvendo o casal de atores Cauã e Grazi e a atriz Isis Valverde, cuja “imprensa marrom” rotulava a última como “o pivô da separação do tal casal perfeito (perfeito???)”.

Surgiu daí (do bate-papo) minha indignação e desabafo do início do texto. Como eu disse, no meu texto anterior sobre “cinema sensual”, a mulher (no caso, a solteiríssima atriz Ísis) sempre é vista como “um ser malévolo desagregador da família”, e o homem (no caso, o comprometido ator Cauã) é apenas uma “vítima da tentação da serpente”, ou seja, a mídia massacra a moral da atriz, sem nem saber o que há de real na dita fofoca, mas em nenhum desses tabloides há referência da culpa (mútua) do galã Cauã, ou seja, ninguém o rotulou “de galinha” ou “de traidor”, ele é apenas “um coitadinho sem vontade própria, uma vítima, que se deixou seduzir pela víbora”??  
Detesto a hipocrisia desse mundo machista, que espertamente segue “os ensinamentos da Bíblia” em prol da soberania masculina. E assim, vamos sendo massacradas, vítimas de espancamentos e linchamentos públicos, em nome de um conceito bíblico ridículo, de que nós mulheres temos o mal em nosso ventre, e nos deixamos ser tomadas pela “mesma serpente que instigou Eva a seduzir o pobre e inocente Adão”. 

Ora, me poupe. Nós, mulheres, quando comprometidas, se somos abordadas pelo sexo oposto, em geral nós vencemos a tentação, pelo simples fato de termos aprendido a respeitar o nosso homem, e porque a sociedade machista nos cobra isso, do contrário seremos rotuladas de “safadas” e marginalizadas pela sociedade, tanto de homens como mulheres machistas.

Mas isso não acontece com o sexo masculino, pois a mesma sociedade machista “cobra serviço” do homem, mesmo que comprometido, do mesmo jeito que cobra do homem solteiro. Ou seja, são raros os homens que suportam a zoação dos amigos, que resolvem sacaneá-los, quando estes não correspondem a um olhar sedutor de uma mulher “atirada”. 

O que me incomoda é o número de mulheres machistas que aceitam isso como “parte da natureza do gênero masculino” (o que é muito cômodo e conveniente para o homem) a ponto de as mulheres (a oficial traída e a possível amante) se “engalfinharem”, mas em geral poupam o safado, como se ele fosse “o único inocente” na história.

Leva a mal não, mas se acontece comigo, eu sou a primeira a colocar o fulano porta a fora, independente se houve ou não sedução por parte da tal mulher, pois o compromisso dele é comigo, e a sedução sempre estará à solta para tudo quanto é lado (tanto do meu lado, quanto do dele), e eu jamais tiraria “satisfação” com a outra mulher. 

No fundo, tenho pena desses homens que se deixam levar pela sociedade machista, e o que vejo muitas vezes são homens se envolvendo com mulheres que nem tinham interesse, e só acontece o envolvimento porque os amigos “cobram serviço” do pobre diabo para atenderem aos apelos sedutores de mulheres “atiradas”, apenas para provarem que “são machos e dão no couro”, e muitas vezes levam para a cama, fêmeas que, em outra situação, jamais teriam se envolvido, não fosse a insistência dos amigos para “mostrar serviço”.

E toda esta reflexão fez lembrar-me do nosso poeta Carlos Drummond de Andrade, num dos versos de “Quadrilha”, em que ele diz “João que amava Tereza que amava Raimundo que amava Maria que amava Joaquim que amava Lili que não amava ninguém” e não pude deixar de me lembrar do mais famoso ranking da fantasia sexual de quase todo homem, o tão falado “ménage à trois”. 

Apesar da disparada preferência, ao que parece, o tal desejo ainda continua bastante restrito ao universo fantasioso, pois para realizá-lo, o homem deseja que seja ele o único do seu gênero, com a participação de duas fêmeas (a sua oficial e uma extra); mas se nós mulheres comentamos sobre a possibilidade do “ménage” ser entre apenas uma de nós e dois homens (o nosso e um outro extra), aí a coisa muda, pois o homem em geral não mais aceitaria realizar tal fantasia (no caso, a fantasia da mulher) de jeito nenhum.

Pausa para reflexão: se formos racionalistas e lembrarmos como funciona a natureza fisiológica sexual da mulher e a do homem, a fantasia do homem é uma utopia, pois é mais fácil uma mulher dar conta de dois ou mais homens ao mesmo tempo do que o contrário, pois raramente o homem consegue “dar duas sem tirar” com a mesma performance. 

Agora, no meu caso, por eu ser exclusivista, tal fantasia não faz parte do meu imaginário sexual, pois para mim a fidelidade mútua é crucial nos meus relacionamentos, não por preconceito ou caretice, mas porque se eu sentir que fui preterida na relação, se não me sentir o único objeto do desejo do meu parceiro, o tesão simplesmente acaba, não rola mais, fico literalmente sem libido e frígida em relação ao traidor, assim “qualquer desatenção, faça não, pode ser a gota d’água”.
Mas tem gente que curte uma fantasia a três, e assim como “tudo a minha volta me leva ao mundo do cinema”, eu não poderia deixar de falar da sétima arte para complementar este meu texto. O que se vê no cinema é que as películas pornôs, em geral, atendem a esses apelos fantasiosos dos homens, e mostram em geral, o “ménage” do jeitinho que o homem gosta, ou seja, um homem e pelo menos duas mulheres, nenhuma história, e muita, muita, e muita baixaria.

Já o cinema de qualidade, o de primeira, em particular o cinema europeu (que, como já disse no texto anterior, está “anos-luz” à frente do cinema estadunidense, em matéria de liberdade sexual) tende a mostrar, em geral, o contrário, ou seja, sempre há uma história por trás de um “menáge” com dois homens e uma mulher, porque este tipo de envolvimento, quando acontece, costuma ir muito além do sexo, quando num relacionamento real deste tipo.
Assim, em “Triângulo amoroso”, filme do cineasta alemão Tom Tykwer (mesmo diretor de “Corra Lola corra”, link* para esse filme, no final do texto), temos a história de um casal (em torno dos 40 anos de idade) que, por circunstâncias imprevistas, se sentem atraídos por um mesmo desconhecido, sem o conhecimento um do outro, numa relação bissexual a três (trailer no final do texto).

“Dieta mediterrânea” (trailer no final do texto) é um filme espanhol em que os prazeres de uma boa cozinha se misturam com os prazeres do corpo, onde a protagonista, uma “expert” chef de cozinha, se divide entre panelas e um tórrido romance com dois belos espécimes masculinos; mas longe de qualquer ousadia maior, o filme sugere mais do que mostra em matéria de cama, focando mais no ritual sensual do preparo da comida, a ser apreciada e degustada prazerosamente.
“Jules e Jim”, um dos clássicos filmes franceses da “nouvelle vague” dos anos 60, de François Truffaut, conta a história de um francês sedutor e um alemão ingênuo que se apaixonam por uma mesma garota (a musa Jeanne Moreau), no início do século XX (trailer no final do texto).

“E tua mãe também” (trailer no final do texto) filme mexicano que gira em torno de uma mulher madura (que, após receber uma má notícia, se encontra em uma crise existencial e emocional) e dois adolescentes (jovens no aflorar hormonal buscando transpassar para a vida adulta) que partem para uma viagem onde inocência e sexualidade irão emergir e colidir.
“Faz de conta que eu não estou aqui”, filme europeu (Itália/França) que conta a história de um adolescente solitário que se envolve com um casal vizinho inicialmente através do voyeurismo (espionando com binóculos os movimentos amorosos do tal casal) até o envolvimento real em que descobre com o casal a paixão, o sexo e a tragédia (trailer no final do texto).

“Três formas de amar” é um filme americano que conta a história de Alex, uma jovem cujo nome unissex (e por causa do nome), é enviada por engano para dividir o quarto da universidade com dois rapazes, que se fecha num triângulo bissexual fazendo valer o poema de Drummond. E relembro “Wicky Cristina Barcelona” do Woody Allen e “Os sonhadores”, do prestigiado diretor Bernardo Bertolucci, que já foram comentados aqui no blog (links* abaixo).
E claro que eu não podia deixar também de lembrar do protótipo do nosso cinema nacional não pornô, o nosso maior representante de sexo a três, “Dona Flor e seus dois maridos” (abaixo, os nossos eternos compositores Chico Buarque e Milton Nascimento na performance musical “O que será“, com a fotografia do filme) e o mais recente “Eu, tu e eles” (abaixo, o nosso Gilberto Gil cantando “Esperando na janela”, com cenas do filme).

Links citados no texto:
*http://rosemerynunescardoso.blogspot.com.br/2011/07/o-sexo-no-cinema-europeu.html
*http://rosemerynunescardoso.blogspot.com.br/2010/04/homem-comprometidonao-rola.html
*http://rosemerynunescardoso.blogspot.com.br/2010/02/o-frenetico-corra-lola-corra.html
















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